top of page

Ambientes psicologicamente inseguros e o sofrimento psíquico no trabalho: Uma leitura Psicanalítica de O diabo Veste Prada.



O filme O Diabo Veste Prada (2006) pode ser interpretado, sob a ótica psicanalítica, como uma representação simbólica dos efeitos de um ambiente de trabalho psicologicamente inseguro. A trama, que gira em torno da jovem jornalista Andy Sachs ao assumir o cargo de assistente da poderosa editora de moda Miranda Priestly, escancara uma realidade comum: o sofrimento psíquico silencioso diante da pressão, do medo e da desumanização nas relações laborais.

O Superego Tirânico e a Submissão Inconsciente

No campo da psicanálise, podemos compreender Miranda como a personificação de um superego tirânico: exigente, castrador e sempre insatisfeito. Andy, diante dessa figura autoritária, é levada à submissão, abandonando gradativamente seus valores, sua vida pessoal e sua identidade. O desejo de reconhecimento se sobrepõe ao seu próprio desejo subjetivo — uma alienação que, segundo Lacan, implica em sofrimento. O trabalho, que poderia ser uma via de realização simbólica, torna-se fonte de angústia e esvaziamento do eu.

Essa dinâmica revela os perigos psíquicos de ambientes hostis: adoecimentos como ansiedade, depressão, síndrome de burnout e perda de sentido — fenômenos amplamente discutidos na clínica contemporânea.

Abril Verde e os Riscos Psicossociais Invisíveis

A campanha Abril Verde, voltada à prevenção de acidentes e doenças no trabalho, historicamente enfatizou os riscos físicos. No entanto, os acidentes psíquicos — invisíveis aos olhos — também ferem, afastam e adoecem. O ambiente tóxico mostrado no filme é, por si, um campo fértil para o sofrimento emocional: metas inatingíveis, humilhações sutis, jornadas exaustivas, ausência de escuta e empatia.

A Lei nº 18.831/24, recentemente sancionada, reconhece e normatiza a importância da saúde mental nos ambientes de trabalho, instituindo medidas de prevenção aos riscos psicossociais. A legislação reforça que assédio moral, pressões abusivas e desrespeito à dignidade humana são formas de violência institucionalizadas, e não meros "excessos" da cultura organizacional.

Prevenir o Adoecimento é também Prevenir Acidentes

A psicanálise nos ensina que o sujeito, quando repetidamente desconsiderado em sua subjetividade, reage com sintomas. A raiva reprimida, o medo constante, a baixa autoestima e a alienação do desejo próprio podem culminar em falhas de atenção, acidentes físicos, conflitos interpessoais ou colapsos psíquicos.

Nesse sentido, promover um ambiente psicologicamente seguro não é um luxo, mas uma necessidade ética. Assim como se previnem quedas ou choques elétricos, deve-se prevenir também os colapsos emocionais. E isso passa por políticas claras, cultura organizacional acolhedora e respeito pela singularidade do trabalhador.

Reflexão Final

O Diabo Veste Prada é mais do que um drama de moda — é um retrato simbólico das engrenagens que produzem sofrimento no trabalho quando o humano é colocado em segundo plano. No mês do Abril Verde e à luz da Lei 18.831/24, somos chamados a repensar essas estruturas. Afinal, prevenir acidentes é também cuidar da saúde mental e emocional daqueles que sustentam o mundo com seu trabalho diário.

 

 
 
 

Comments


bottom of page